Dick, apelido de João Henrique da Silva, é um nativo da ilha que pesca desde os 10 anos de idade e hoje, aos 73, tem a própria parelha na Cachoeira do Bom Jesus. Tem pouco sotaque manezinho, pois muito já andou por outras cidades. Ao longo da vida, já pescou nas embarcações do Rio Grande, foi motorista de ônibus, morou em São Paulo e tornou-se músico e baterista.
O pescador conta que conheceu a ilha como ela era antes das grandes transformações provocadas pelo processo de urbanização e compartilha a curiosa história de um fenômeno que despertava fortes emoções entre os pescadores e moradores antigos: a Luz de Bota, como é chamada ali na Cachoeira do Bom Jesus e como nomeu uma de suas embarcações.
Apesar de ser chamada de lenda ou ser motivo de piada entre os mais jovens, Seu Dick garante que o fenômeno é verdadeiro. Já presenciou diferentes vezes em Canasvieiras e nos Ingleses, enquanto pescava de noite: “A gente viu essa luz, e a gente veio embora. Ela aparece clara, longe. Quando a gente pensa que é ela […], aí ela clareia bem forte, depois ela fica do tamanho da brasa de um cigarro, aí ela vem. Pelo escuro, não existia luz, não existia claridade na estrada. Então ela vem acompanhando, ela não faz mal. Aí ela vem aquela brasa assim, a gente via que ela vinha assim, caminhando”.
O nome dado ao fenômeno tem relação com um morro da região, na direção da Lagoinha do Norte, chamado de Morro do Bota. O pescador garante que ela não faz mal pra ninguém, e explica que hoje ela não aparece mais porque as cidades têm muita iluminação artificial durante a noite.
A curiosidade acerca do fenômeno já fez Seu Dick questionar pescadores de outras localidades sobre a presença do mesmo. Perguntou para um pescador em Itajaí, que confirmou que lá também presenciava-se a manifestação chamada de “Luz do Trilho”, porque aparecia sempre nas proximidades do trilho do trem. Perguntou também no Rio Grande e obteve outra resposta afirmativa. Lá chamavam de “Luz da Linha”, também por acompanhar a linha do trem. Igualmente, identificou o fenômeno em uma pequena cidade nas proximidades da Lagoa dos Patos, onde chamavam de “Luz do Passo”, fazendo referência à pequena “Ponte do Passo” por onde a luz aparecia.
Mesmo diante da descrença das gerações mais jovens, o pescador garante que em qualquer lugar à beira de praia onde se perguntar pela “luz”, os antigos vão relatar a presença de um fenômeno semelhante. Ademais, podemos encontrar correspondência com o boitatá, a “cobra de fogo” da cosmologia guarani que virou figura da cultura popular brasileira. De fato, hoje em dia os cientistas propõem uma explicação para o que chamam de “fogo-fátuo”, associando-o à combustão espontânea do gás metano liberado por organismos em decomposição.
PREPARO PREFERIDO DA TAINHA
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